Quando um matemático contemporâneo se põe a fazer uma prova, seu procedimento difere daquele adotado por um matemático “antigo”. Talvez se possa dizer que os antigos imaginassem que a matemática se se liga a alguma visão, ou imagem, do eterno. De todo modo, é evidente que os contemporâneos se diferenciam por buscar realizar essa visão do eterno, de modo que ela possa ser atribuída, ou implicada, por meio de uma escrita ou de um “dispositivo mecânico”, nas suas próprias formulações matemáticas, ou que, pelo menos, elas possam dar conta das condições de possibilidade dessa implicação – embora aí já não estejam situados estritamente no campo disciplinar da matemática.
A condição de possibilidade do conhecimento matemático, entretanto, não é a eternidade da formulação, mas a mera repetibilidade (e também a efetiva repetição!) da demonstração. E como a demonstração terá que ser repetida, é o caso de nos perguntarmos se a abordagem contemporânea (de uma formulação “sem pecado”) não seria, na prática, um desvio de rota improdutivo, um imenso engano. Se for esse o caso, há, de todo modo, um ganho no projeto da matemática contemporânea, que é a ruptura de todos os condicionamentos do exercício matemático à metáfora e à palavra de ordem. A aspiração ao eterno forçou a (tentativa de) remoção de todos os obstáculos conjunturais, de todos os vínculos históricos. Forçou a postulação de uma liberdade infinita no campo da expressão. Ao mesmo tempo, inclinou a pesquisa, por vezes, na direção do infrutífero, do desnecessário. Seria o caso de, hoje, promovermos um retorno ao efêmero no campo expressivo, no âmbito da metodologia da pesquisa em matemática, sem perder de vista a liberdade superlativa dos “eternistas”, que, afinal, é também nossa herança. Esse retorno ao efêmero, ao contextual, ao circunstancial, não deve fazer pender a balança na direção oposta: é de um “caminho do meio” que falamos aqui. Não se trata, portanto, de um “abastardamento”, de um relaxamento de exigências sem uma contrapartida. A contrapartida é justamente o mandamento de que as definições e demonstrações só são tomadas como válidas no contexto de um processo contínuo de reproposição e redemonstração, que descreve uma linha de fuga, no plano de imanência do qual fazem parte a expressão e o conteúdo, onde a distinção entre sintaxe e semântica não é trivializada, muito menos idealizada. Em benefício da computação isso (uma matemática “mestiça”) é pedido; graças à computação isso (uma matemática experimental) é possível.
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